
Mas eis que aparece Zoológico de Vidro e reafirma o teatro também na sua forma aparentemente “tradicional". Nessa mirada, não importa tanto as perspectivas ou elucubrações entre teatro dramático ou pós-dramático, mas o entendimento de que a expressão artística deve encontrar seu canal e formular questões independente dos rótulos a priori, já que o “experimental” pode nada efetivamente experimentar.
A montagem do Ulisses Cruz para o texto de Tennessee Williams consegue erguer um mundo no palco. Não dentro de um esquema naturalista, edificando o ilusionismo. Mas contando uma história com o jogo teatral quente, entusiasmado, em um belo movimento que aproxima tradição e modernidade.
Quando questiono aqui o uso de termos depreciativos, como “tradicional”, estou considerando que a boa obra é a do seu tempo, das formulações do seu tempo, das propostas do seu tempo, do “porvir” do seu tempo. E, nesse caso, longe da fossilização do texto e de uma encenação reverenciosa, o que vemos é um movimento de pensamento sobre a cena que se realiza quase que invisivelmente, estando aí seu maior mérito: não há uma demonstração do conceito, há experiência de corpos que pensam e elaboram artisticamente a partir de certas escolhas e parâmetros.
Nesse sentido, dramaturgia e encenação conseguem caminhar em diálogo profícuo, evidenciando inteligência na criação, seguindo com êxito a proposta de valorização da memória, orientadora do discurso (que vira imagem) do narrador, e do peso dos encontros nas ações (e/ou inações) dos personagens.
E o que temos no zoológico? Uma família conduzida pela forte presença de uma mãe que a tudo domina; filhos que não encontram autonomia, refugio nos sonhos; frustrações e impulsos de revolta abortados; encontros em baixa potência; e a narrativa de um dos integrantes da família, que revela, com desapontamento, frágil esperança e amargura, “sua versão dos fatos”. Essa pode ser a mirada ou a lembrança do enredo da peça. Não poderíamos dizer simplesmente o enredo, pois esses apontamentos se apresentam a partir de um filtro do que foi visto, do que foi possível ver do encenado.
A montagem do Ulisses Cruz para o texto de Tennessee Williams consegue erguer um mundo no palco. Não dentro de um esquema naturalista, edificando o ilusionismo. Mas contando uma história com o jogo teatral quente, entusiasmado, em um belo movimento que aproxima tradição e modernidade.
Quando questiono aqui o uso de termos depreciativos, como “tradicional”, estou considerando que a boa obra é a do seu tempo, das formulações do seu tempo, das propostas do seu tempo, do “porvir” do seu tempo. E, nesse caso, longe da fossilização do texto e de uma encenação reverenciosa, o que vemos é um movimento de pensamento sobre a cena que se realiza quase que invisivelmente, estando aí seu maior mérito: não há uma demonstração do conceito, há experiência de corpos que pensam e elaboram artisticamente a partir de certas escolhas e parâmetros.
Nesse sentido, dramaturgia e encenação conseguem caminhar em diálogo profícuo, evidenciando inteligência na criação, seguindo com êxito a proposta de valorização da memória, orientadora do discurso (que vira imagem) do narrador, e do peso dos encontros nas ações (e/ou inações) dos personagens.
E o que temos no zoológico? Uma família conduzida pela forte presença de uma mãe que a tudo domina; filhos que não encontram autonomia, refugio nos sonhos; frustrações e impulsos de revolta abortados; encontros em baixa potência; e a narrativa de um dos integrantes da família, que revela, com desapontamento, frágil esperança e amargura, “sua versão dos fatos”. Essa pode ser a mirada ou a lembrança do enredo da peça. Não poderíamos dizer simplesmente o enredo, pois esses apontamentos se apresentam a partir de um filtro do que foi visto, do que foi possível ver do encenado.
Talvez esteja aí o que considero digno de nota: há uma história e, em paralelo, há (por vezes num campo virtual) um diálogo com os criadores e com as memórias (muitas) que percorrem todo o tempo da peça. Como se, para além da demonstração de um procedimento, pudéssemos perceber a expansão de um campo de expressão amplo que ultrapassa o visível. Mas isso acontece em toda obra? Acredito que não. Em alguns trabalhos somos apenas conduzidos pela fábula ou, às vezes, apresentados aos dispositivos que ressaltam o processo, mas que nos fazem, aqui e ali, duvidar que este mesmo processo faça parte de um diálogo entre propostas, idéias, procedimentos e criação.
E, no caso da montagem de Ulisses Cruz, há uma comunicação que não se frustra, pelo contrário, levanta questões sobre os caminhos escolhidos, as linhas de comunicação (entre várias possíveis) e a articulação entre os elementos artísticos em cena e a dramaturgia de Tennessee Williams.
E, no caso da montagem de Ulisses Cruz, há uma comunicação que não se frustra, pelo contrário, levanta questões sobre os caminhos escolhidos, as linhas de comunicação (entre várias possíveis) e a articulação entre os elementos artísticos em cena e a dramaturgia de Tennessee Williams.
O eixo organizador da peça são as reminiscências de Tom (Kiko Mascarenhas), o filho que reconta a história da família. Nesse caso, ele figura em um naturalismo de quem vive o drama e, por vezes, se distancia ao narrar. Os outros personagens são projetados pelo narrador em um plano mais expansivo, ressaltando posturas variáveis: do autoritário ao patético, passando pela extrema fragilidade e pela solidão. É interessante observar o trabalho de Cássia Kiss (Amanda Wingfield, a mãe) e Karem Coelho (Laura, a filha) ao optarem em fazer de suas personagens também projeções de um olhar amargurado. Força, lamento e excesso que sufoca; insegurança e fragilidade (...) atuações inteligentes e sensíveis. Completa o elenco Erom Cordeiro (Jim) em um papel ajustado no filtro da memória que traz a possibilidade de um mundo para além das paredes da casa da mãe.
Enfim, uma obra que, após tanto tempo desde a apresentação em Belo Horizonte, ainda reverbera aqui.
Enfim, uma obra que, após tanto tempo desde a apresentação em Belo Horizonte, ainda reverbera aqui.