sábado, 30 de janeiro de 2010

agora

Agora (a.a)

AGORA QUE AGORA É NUNCA
AGORA POSSO RECUAR
AGORA SINTO MINHA TUMBA
AGORA O PEITO A REBUMBAR
AGORA A ÚLTIMA RESPOSTA
AGORA QUARTOS DE HOSPITAIS
AGORA ABREM UMA PORTA
AGORA NÃO SE CHORA MAIS
AGORA A CHUVA EVAPORA
AGORA AINDA NÃO CHOVEU
AGORA TENHO MAIS MEMÓRIA
AGORA TENHO O QUE FOI MEU
AGORA PASSA A PAISAGEM
AGORA NÃO ME DESPEDI
AGORA COMPRO UMA PASSAGEM
AGORA AINDA ESTOU DAQUI
AGORA SINTO MUITA SEDE
AGORA JÁ É MADRUGADA
AGORA DIANTE DA PAREDE
AGORA FALTA UMA PALAVRA
AGORA O VENTO NO CABELO
AGORA TODA MINHA ROUPA
AGORA VOLTA PRO NOVELO
AGORA A LÍNGUA EM MINHA BOCA
AGORA MEU AVÔ JÁ VIVE
AGORA MEU FILHO NASCEU
AGORA O FILHO QUE NÃO TIVE
AGORA A CRIANÇA SOU EU
AGORA SINTO UM GOSTO DOCE
AGORA VEJO A COR AZUL
AGORA A MÃO DE QUEM ME TROUXE
AGORA É SÓ MEU CORPO NU
AGORA EU NASÇO LÁ DE FORA
AGORA MINHA MÃE É O AR
AGORA EU VIVO NA BARRIGA
AGORA EU BRIGO PRA VOLTAR
AGORA

um dia ...

Um dia sonhei que podia atravessar essa ponte. Sonhei que os passos eram dados com segurança, que minhas pernas não tremiam. Que até podia olhar pra trás, sem medo, nem busca de aprovação, algo como: - vá sim, você merece ser feliz. Um dia sonhei que a decisão não estava sustentada em frágeis bambus, que a força era mantida por um desejo elaborado.
Um dia sonhei.
Mas ainda estou aqui. Sigo devagar, dando voltas. Às vezes estaciono. Em outros momentos percebo que a ampliação dos contornos se dá devagar, quase imperceptível a olho nu. A alegria roça a minha pele, mas, arredia, insiste em firmar o desapego. Eu já não lamento.
Recolhida, em danças que só eu percebo, por se darem em uma esfera íntima e inacessível, ouso movimentos de força que julgava impossíveis. Voltas, deslizes e aberturas compõem quadros sem molduras, cartografias sem limites nesse meu devir-bailarina.
Um dia sonhei.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

dos meus tempos de sambista

Em busca da Homenagem Perdida

Ainda não encontrei a levada que me faça homenagear você
delicadamente
assumidamente
Exposição em larga escala
De um semba candente

Ainda não encontrei a levada que me faça homenagear você
Cuidado nas palavras
Que revelam o desejo de um amor rente

O sentimento de convívio e história
Narrado na língua da gente


Ainda não encontrei a levada que me faça homenagear você
Um tatibitate solene
De elegância sentimental

Que harmonize corpos e dores
alegrias e dissabores

Estridencia adicional

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

lágrimas negras

Na frente do cortejo
O meu beijo
Forte como o aço
Meu abraço
São poços de petróleo
A luz negra dos seus olhos
Lágrimas negras
Caem, saem, dóem

Por entre flores e estrelas
Você usa uma delas como brinco
Pendurada na orelha
Astronauta da saudade
Com a boca toda vermelha
Lágrimas negras
Caem, saem, dóem

São como pedras de moinhos
Que moem, roem, moem
E você baby vai, vem, vai
E você baby vem, vai, vem

Belezas são coisas acesas por dentro
Tristezas são belezas apagadas pelo sofrimento
Lágrimas negras
Caem, saem, doem
(jorge mautner/nelson jacobina)

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

peixes

e pássaros

domingo, 3 de janeiro de 2010

...

Sala, televisão ligada. Quarto, televisão ligada. O mesmo canal. Na sala, o pai dorme. No quarto, o filho come. "Vez ou outra", o pai olha pro que passa na tela e resmunga para si, como se deixasse claro que não cai naquela manipulação. O filho nada diz, come atento ao que passa na tela; entre uma garfada e outra, ri. Ri do que? O que segura seu olhar? E se pensasse em desligar? Comeria? Riria do que? Assiste e come e ri. O pai dorme, não, cochila. E, dependendo da risada do filho, acorda do seu cochilo e assiste e resmunga e critica, mas nunca ri. E do que riria? O que tanto critica? E se pensasse em desligar? O que criticaria? O filho passa pela sala e vai até a cozinha rechear o seu prato. Pai e filho mal se olham, mas o filho não perde a oportunidade, ao passar novamente pela sala, de parar em frente à televisão e assistir e rir, como se buscasse a cumplicidade e uma peculiar aproximação. Pela tela os olhares se aproximam, frações de segundo, e se perdem numa estranha desatenção, rapidamente disfarçada pelo riso, por um resmungo tímido (...). O filho volta pro quarto abastecido, pronto pra comer e rir; o pai, retoma o cochilo e o "vez ou outra" da dispersão.
(da série "novas-velhas interações 2010")

sábado, 2 de janeiro de 2010

2010

"(...) e quero fátria"

instigado

Instigado pode ser pra começar.
A palavra que acompanha a ficção da retomada.
A ficção que fundamenta o recomeço.
Instigado-ficção-recomeço num grande bloco agora anunciado.