domingo, 26 de abril de 2009

fragmentos

"(...)
Não encontrava graça naquele excesso de música nos finais de semana, pela manhã, em que o primogênito, esquecido das gentilezas, era acometido da tresloucada função de acordar o mundo num estridente mau gosto musical. “Histéricos”, pensava, uns mais que os outros. Em meio à felicidade em modulações desreguladas dos habitantes daquele apartamento, procurava um lugar em que pudesse ficar tranqüilo, sem ser visto e importunado. Tinha problema com a alegria, já que, quase sempre, desencadeava afagos desnecessários, apertos, convites pra passeios fora de hora, ânimos pra estripulias e idéias sobre limpeza que o fazia ficar bem irritado - fora as tentativas malogradas e patéticas de comunicação, num tatibitate que o levava a sentimentos, quase humanos, de compaixão e tédio. Era um gato sistemático, tinha consciência disso e não se importava. Não se importava também de estar encurralado no clichê do “ser gato no mundo”: preguiçoso, temperamental, arredio, um tanto lânguido no viver, irritadiço. Utilizava esses traços, casualmente, quando lhe convinha. Sabia que era mais, que colidia com certas expectativas, mas não se importava com juízos apressados, desde que não lhe incomodassem. (...)"

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