segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

Aqueles Dois


A peça Aqueles Dois está na Campanha de Popularização do Teatro.

Sala Juvenal Dias do Palácio das Artes.

A partir do dia 08/02.


Aqueles dois em delicada sintonia...

Adaptação, desconstrução, diálogo, exercício, processo coletivo (...) talvez seja tudo isso junto e/ou em diálogo, mas, quem sabe, estejamos diante de algo que teime em escapulir das definições apressadas, dos enquadramentos. Digo isso porque acredito que a peça Aqueles Dois (Cia Luna Lunera) dimensiona o texto de Caio Fernando Abreu para um território em que as referências poéticas, musicais, literárias e de vida dançam em uma coreografia delicada, envolvendo o texto literário em uma teatralidade que se ajusta muito bem às propostas de pesquisa de linguagem e de uma espontaneidade que, felizmente, vitaliza o texto e o próprio teatro.
É emocionante partilhar encontros, descobrimentos. E Aqueles Dois nos chega com a generosidade de um abraço. Mas por que? Como? São perguntas necessárias no exercício de uma reflexão que não se encerra no elogio.
Percebo que a proposta apresentada estabelece um pacto com o espectador ao propor um campo íntimo de encenação (espaço do teatro e escancaramento da teatralidade), e reforçar o convite à imersão em uma história que adquire várias vozes e possibilidades de uma escritura teatral, sem perder a fina tessitura do conto. Nesse sentido, há todo um cuidado em abrir frentes, em um campo de linguagem que aciona sentidos e percepções, ao contar a história dos dois funcionários públicos imersos no “deserto de almas” burocrático e as afinidades eletivas que os aproximam afetivamente.
O processo extravasa “poesia”, filia os atores na seara dos criadores, donos que são da cena, incluindo aí uma espontaneidade que nos instiga pela sua aparente fragilidade. No entanto, logo percebemos a necessidade de substituir a palavra fragilidade por delicadeza (essa proposição ética) que dialoga com o texto e com todo o entorno afetivo tão bem amarrado. No deslizamento que os atores fazem em cena aberta por personagens, situações, emoções e espaços, em um belo movimento de multiplicação-diferenciação-identificação, revela-se uma integração poucas vezes vista. É impossível não associar o trabalho atual da Cia Luna Lunera com os instigantes Ensaio Hamlet e Gaivota (Tema para um conto curto) da Cia dos Atores, em que tão bem se ajusta o verso de Orides Fontela: quebrar o brinquedo ainda é mais brincar[1]. As propostas desses grupos se aproximam pela disposição em pesquisar a linguagem cênica e elaborar trabalhos na perspectiva do que podemos aqui chamar de desdobramento continuo, do texto e da cena, apontando para caminhos onde o fragmentado encontra sua unidade no exercício do livre jogo instituído / contra a limitação das coisas (...).

Para não terminar, só mais algumas palavras...

Um campo afetivo emerge do encontro.
Não se sai ileso da experiência em que arte e vida se misturam, em que ação e narração deixam escapulir desejos, em que as afinidades se abrem para novos possíveis...

... em que o coração aberto do expectador se torna cúmplice da piscadela de Odilon Esteves, ao final da apresentação, quando comenta sobre os que ficaram no deserto de almas (talvez infelizes pra sempre) ... e a força de uma providencial deserção ... um devir-afeto.


[1] Todos os versos presentes no texto são do poema Ludismo, de Orides Fontela.
FONTELA, Orides. Ludismo. Poesia Reunida (1969-1996). São Paulo, COSACNAIF; Rio de Janeiro, 7 Letras, 2006

2 comentários:

  1. Fofs,
    estou orgulhosa de você!
    Como pode uma pessoa que tem tanto a dizer para o mundo não ter tido, até hoje, um blogue?
    Pois então, nada como materializar - na grande rede - certas potências geradas, inclusive, pelos bons encontros:

    Bons encontros são aqueles dos "vivas"!

    Nada como construir UMA CASA, né Fofs?
    Certos olhares, os raros, só pertencem mesmo
    à jovens Senhores.

    Bjos, tenha um Bom Ano!

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  2. Viva eu, viva tu, viva o rabo do tatu.
    pois é, musa! pra alguma coisa serve chegar a condição de jovem senhor. e muito me agrada essa desmedida: tranquilo mergulho, às vezes. o Fodas aplicado em pequenas doses.
    e as grandes redes? bem, grandes, complicadas e imperfeitinhas. nós, eu, tu e rabo de tatu também. alguém segura o rabo, por favor! e os bons encontros ainda potencializam a freqüência (ainda temos trema?).
    beijos, amores e flores!

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