a
partir de agora ela estava sozinha. perdeu-se deliberadamente dos companheiros
iniciais pra se aproximar da enérgica força daqueles com paus e pedras. olhos
irritados e sensação de sufocamento poderia ser a antecipação, ainda que
distante, da vertigem já sentida. mas não havia pensamento de futuro em meio a
barafunda no entorno e que parecia também tomar conta dela. sentia, ao mesmo
tempo que paralisada, em franca atuação por compor aquele bloco de adesão à
turba. era também multidão em manifesto, em repúdio, em violenta hostilidade à
hostilidade maior, instituída e histórica. sem bandeira e vagando por entre
pessoas que corriam e gritavam, costurava atabalhoadamente a rua que não era
mais rua e seu corpo já perdia a dimensão cotidiana - havia algo que a fazia
lembrar do tesão de estar no palco -, e também já não era corpo, ou melhor, era
sim corpo em composição com algo que ela recusava chamar de maior por receio de
qualquer transcendência. corria e trombava em pessoas que lhe empurravam como
se estivesse imersa num mar de ondas revoltas. alegria do surf poderia ser uma
imagem cabível ali, porém redutora. o impacto do menino que caiu do viaduto lhe
trouxe o assombroso peso do real. qualquer sentido parecia estar submerso ou
além do tempo presente.
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